segunda-feira, 25 de outubro de 2010

III – CONFIRMAÇÃO – Louvores em particular

Atenção à estrutura global a que obedece o sermão. No particular, Vieira procede por analogias, por leitura alegórica, não por dedução, racionalmente.

Paralelismo, jogo de palavras:
“Só uma diferença havia entre Sto. António e aquele peixe:
Que o peixe abriu a boca contra quem se lavava e
        Sto. António abria a sua contra os que se não queriam lavar.”

Ironia:
“Ah moradores do Maranhão, quanto eu vos pudera dizer neste caso! Abri, abri estas entranhas; vede, vede este coração.
Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não prego a vós, prego aos peixes.”

Reparar que o discorrer do pregador sobre cada peixe condu-lo sempre a Sto. António. Usando a linguagem do peixe para falar do Sto., constrói numerosas alegorias dentro da alegoria maior do sermão:

Alegoria das naus e da rémora (reparar também nos paralelismos e nas interrogações retóricas):

“Quantos, correndo na Nau Soberba, com as velas inchadas do vento e da mesma soberba (que também é vento), se iam desfazer nos baixos, que já rebentavam por proa, se a língua de António, como rémora, não tivesse mão no leme, até que as velas se amainassem, como mandava a razão, e cessasse a tempestade de fora e a de dentro?
Quantos, embarcados na Nau Vingança, com a artilharia abocada e os bota-fogos acesos, corriam enfunados a dar-se batalha, onde se queimariam ou deitariam a pique, se a rémora da língua de Sto. António lhe não detivesse a fúria, até que, composta a ira e o ódio, com bandeiras de paz se salvassem amigavelmente?
Quantos, navegando na Nau Cobiça, sobrecarregada até às gáveas e aberta com o peso por todas as costuras, incapaz de fugir, nem de se defender, dariam nas mãos dos corsários com perda do que levavam ou iam buscar, se a língua de Sto. António os não fizesse parar, como rémora, até que, aliviados da carga injusta, escapassem do perigo e tomassem porto?
Quantos, na Nau Sensualidade, que sempre navega com cerração, sem sol de dia nem estrelas de noite, enganados do canto das sereias e deixando-se levar da corrente, se ririam perder cegamente, ou em Cila ou em Caríbdis, onde não aparecesse navio nem navegante, se a rémora da língua de Sto. António os não contivesse, até que esclarecesse a luz e se pusesse em via?”

Discurso engenhoso, alegoria do torpedo e da pesca, ironia:
“Quem dera aos pescadores do nosso elemento, ou quem lhe pusera esta qualidade tremente (ambiguidade, metáfora), em tudo o que pescam (ambiguidade, metáfora) na terra!
Muito pescam, mas não me espanto do muito; o que me espanta é que pesquem tanto e tremam tão pouco.
Tanto pescar e tão pouco tremer!”

“No mar, pescam-se as canas, na terra pescam as varas (e tanta sorte de varas); pescam as ginetas, pescam as bengalas, pescam os bastões e até os ceptros pescam, e pescam mais que todos, porque pescam cidades e reinos inteiros.
Pois é possível que pescando os homens cousas de tanto peso, lhes não trema a mão e o braço?!”

Paralelismo e apóstrofe:
“Prezem-se as aves e os animais terrestres de fazer esplêndidos e custosos os banquetes dos ricos,
e vós gloriai-vos de ser companheiros do jejum e da abstinência dos justos.”

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