segunda-feira, 25 de outubro de 2010

I - EXÓRDIO (proposição e invocação)

Na introdução (exórdio), a partir do conceito predicável Vós sois o sal da terra, o Vieira propõe o tema, o problema.

Síntese do pensamento do exórdio
O pensamento do exórdio pode-se sintetizar assim:
O Maranhão está corrupto por uma de duas razões ou pelas duas simultaneamente:
ou porque o sal não salga ou porque a terra se não deixa salgar.

Se o sal não salga, muito mal estão os pregadores.
Se a terra se não deixa salgar, que se poderá apesar de tudo fazer?
Num contexto semelhante ao de S.to António em Arimino (de agitação, de rejeição aberta), Vieira decide proceder como ele: pregar aos peixes, ali no Maranhão.

Intertextualidade
Já no exórdio, mas também ao longo de todo o sermão, vão ocorrer muitas citações, isto é, no texto de Vieira cruzam-se outros textos. É a este cruzamento – comum a quase tudo que se escreve ou diz – que se chama intertextualidade.

O Sermão, texto barroco
No Sermão devemos procurar o excesso barroco. Ao nível estilístico há casos muitos claros. As frases seguintes são um exemplo:
“Ou é porque o sal não salga ou porque a terra se não deixa salgar.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina;
ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhe dão, a não querem receber.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma coisa e fazem outra;
ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem mais imitar o que eles fazem que fazer o que dizem.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo;
ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites”.
Temos aqui a repetição (anáfora), a antítese sal/terra, ouvintes/pregador e outros, o paralelismo da construção das frases, a linguagem alegórica ao lado da linguagem corrente…
Há vários segmentos de teor semelhante ao longo do sermão.
Outro caso de paralelismo ou simetria:
“Deixa as praças, vai-se às praias;
Deixa a terra, vai-se ao mar”

Quando Vieira declara que S.to António foi “sal do mar”, está a usar um paradoxo; de facto ele está a usar um discurso engenhoso, feito de subtilezas (conceptismo). Esse discurso engenhoso já estava naquela sequência paralelística: a terra que se não deixa salgar é descoberta sua, não estava no texto evangélico, as várias hipóteses explicativas são outros tantos achados engenhosos, da sua argúcia, etc.
Os quiasmos.

A crítica à sociedade do Maranhão
Vieira pregou este sermão três dias antes de se embarcar ocultamente para Portugal a procurar ajuda para a sua luta antiesclavagista. O leitor deve estar atento para descobrir até que ponto e de que modo se reflecte no texto o calor da polémica, da agitação que grassava na cidade.
É possível contudo que este sermão escrito divirja muito do sermão originalmente pregado.



Observações estilísticas

Ou é porque o sal não salga ou porque a terra se não deixa salgar.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina;
ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra;
ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem que fazer o que dizem.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo;
ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites.
Não é tudo isto verdade? Ainda mal!

A expressão alegórica e as suas traduções: ambiguidade, plurissignificação.
A anáfora, o paralelismo, a antítese. A argúcia.

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